Aconteceu entre 1958 e 1960,
não sei precisar a época certa, devia ter oito ou dez anos. Como de hábito
semanal, reuníamos alguns amigos para ir ao cinema. Sempre tinha no mínimo,
cinco ou mais crianças e uma mais “velha” pra tomar conta da molecada. Um grupo animado de futuros cinéfilos.
Fomos ao Cine Poty, no final da
Av. Deodoro, sessão das duas – pra voltar cedo pra casa. Edna, a mais velha,
liderava o grupo. Apenas eu e ela de mulher, e muitos meninos. Além de ser filha de gente abastada (o
pai era dono da famosa Movelaria Globo, ali vizinho à rua onde eu morava), era
uma menina sapeca, ousada, loura e muito alegre. Eu a admirava pela modernidade e,
principalmente, porque na casa dela tinha uma sanfona e bicicleta, ora vejam
só. Meus anseios musicais e de liberdade
falavam alto em tenra idade.
Voltando ao passeio, terminada a
sessão de cinema, resolvemos ir a pé – uma distância e tanto – para casa.
Descemos a ladeira em frente ao Cine Poty em direção à Ribeira, saímos por trás
do Teatro Alberto Maranhão e seguimos, agora subindo, pela Av. Junqueira Aires,
pelo lado da sombra.
À altura do Centro de Saúde – um velho
prédio próximo à antiga Capitania das Artes -, não resistimos ao sapotizeiro. Lá estava, aquela árvore imponente talvez
secular, com mais de quinze metros de altura e repleto de sapotis, minha fruta
preferida. Era muito alta, não
arriscaríamos nossos lindos vestidos de organdi subindo pra colher o fruto. Os
meninos preferiram procurar pedras e paus pra jogar na árvore, assim, quem
sabe, cairia algum. Nada! Aquela árvore gigante e majestosa afrontava nossa pequenez.
Eis que Edna teve uma “brilhante
idéia”: jogar sua linda carteira (bolsa) social na árvore e ocorreu o inesperado.
Melhor dizendo, a bolsa da Edna enganchou nos galhos e não caía por nada desse
mundo. Agora era a bolsa da amiga o objeto principal, o sapoti ficou esquecido.
A noite caiu, a nossa aflição
infantil foi aumentando e deu lugar ao estado de euforia no início da
traquinagem. Cada um com seus medos, a educação era rigorosa na época,
inventava uma desculpa mais apropriada. Já por volta das oito horas, de tanto
chacoalhar os galhos da árvore, a bolsa caiu e fomos em direção ao nosso
bairro, o Alecrim, com o coração na mão.
Não adiantou contar a história
verdadeira, não colou. Eu tomei uma bela surra, por vários motivos: por não ter
vindo direto para casa após o cinema, por ter vindo a pé, pela farra com os
meninos no sapotizeiro, por ter chegado em casa em “altas horas” para uma
criança.
Mas que foi uma aventura e tanto,
foi. Tudo por um sapoti, valeu a pena!
Bsb, 25/set/2012
Foi aqui, nessa rua, onde tudo aconteceu. Av. Junqueira Aires, Natal (RN)
Do lado esquerdo subindo mais um pouco.
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