segunda-feira, 30 de julho de 2012

Minha vida e as fábricas de bebidas


Ao tomar ciência do falecimento do dono da Dore,  Mister Walter Byron Dore, as lembranças me levaram ao tempo de ginásio, no Atheneu Norteriograndense. O melhor lanche, inesquecível. Todas as tardes, eu pedia, invariavelmente, um sanduíche de pão seda com queijo de manteiga e um Grapette – um dos refrigerantes de maior sucesso da Fábrica Dore. O velho jargão “quem bebe repete” fazia jus ao produto. Indescritível sabor!
Contudo, a minha história com os refrigerantes começou bem mais cedo, em 1953/1954, quando fui alfabetizada pela professora Ceci naquele método ba-be-bi, etc. O detalhe é que a escolinha de alfabetização ficava na avenida Manoel Miranda – paralela à Elviro Carrilho, onde nasci – num depósito da Indústria e Comércio Jade que estabelecia-se na cidade à época.
Fui crescendo e o Guaraná Antarctica sempre esteve presente em nossas mesas de domingo, nas festinhas, nos aniversários.  Era o melhor, sem dúvida, continua sendo até hoje.
Aos treze anos assumi meu primeiro emprego, contrariando meu pai, que dizia que filha dele não precisava trabalhar e ainda mais tão nova. Bati pé, insisti e assim, já com o diploma de datilografia conquistado aos onze anos e médio português, fui trabalhar na Ribeira como Secretária da Indústria de Bebidas Maguary, na verdade, um escritório de representação .  A Maguary estava surgindo no mercado com deliciosos sucos concentrados  – uma novidade. 
Em Brasília, tive o privilégio de trabalhar como Secretária Executiva da multinacional Companhia Brasiliense de Cervejas – a famosa Skol. Estava sendo implantada e na hora da inauguração, aquela deslumbrante cascata de espuma e a certeza de que todo o trabalho tinha dado certo. Nascia a Skol brasiliense,  a terceira garrafa ganhei de presente.  Guardei durante anos como mascote de um tempo bom.  Não faltou cerveja lá em casa por muito tempo, devidamente apreciadas em taças personalizadas da Skol e que fizeram o favor de quebrar. Os refrigerantes vinham das fábricas paulistas para Brasília. Funcionários tinham uma quota mensal razoável a preço de custo, aproveitávamos.
Mas, voltando ao primeiro parágrafo, assunto que acionou tantas boas lembranças, quero agradecer como representante da Geração Grapette, aos que já se foram, Mister Sidney, Mister Walter e a todos que fizeram e fazem a Dore, no Brasil, pelos momentos felizes que me proporcionaram e, podem acreditar:  Grapette é o melhor refri que já tomei na minha vida.
Já tem exatos cinquenta e um anos de amor à primeira vista, sem substituto.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

MÃE CHIQUINHA


(minha avó paterna, esposa de Tonheca Dantas)

Mulata, filha de escrava, guerreira.
Mulher de ancas largas e olhos azuis.
Mistura das raças recém-abolição.

Espécie rara de cabelo pichauim
e belas pernas bem torneadas.

Doçura incomparável, voz de mel,
Que tanto PRAIEIRA (*) cantastes.
Apesar de ser analfabeta,
essa letra nunca errastes.

Mulher de comunicação, mesmo dizendo
na sua simplicidade: “não seio ler”,
mas tua neta sabia e escrevia as saudades
tal como Fernanda Montenegro
numa grande central do coração,
na Terra do Sol, no país chamado Brasil.

Saudades da mulher parideira, de filhos ausentes:
(Mirto, Afonso, Ademar e outros mais)

Mulher de tantas viagens e modelitos,
do Rio de Janeiro, do Rio Grande do Sul.

Mulher que captava com rapidez
o sotaque e costumes fazendo rir seus netos,
da nova avó de “fala diferente” das terras onde pisou.

Ah! Que saudade daquele manteau com capuz,
que nunca usamos na Terra do Sol ardente.

Saudades de ti, Mãe Chiquinha,
antes de ser avó, uma verdadeira mãe
de colo e andar macios.
Jamais teve pressa.

Mulher sem alento, mulher sem lamento;
Amélia das Amélias, pura Camélia.


Flor amorosa cujos cabelos podei,
boca sem dentes, mas sem fel, nem fedor.
Pele fina e macia, sensível aos mais
tenros galhos dos nossos quintais.

Mulher solitária de muitos lares, nenhum seu.
Mulher de Tonheca, mulher de munheca,
que costurava “liformes” para americano
que só falava da vida como um encanto.

Ah! Minha velha, minha avó, quanta saudade.

Em teu colo puro e manso repousei minha infância
e te vi muda, ao não entender mais os “humanos”.

E não tivestes pressa em nos deixar...

Quase um século marcando presença,
ainda que silenciosa, porém eloquente.

E, ao sair desse mundo, não te chorei
minha querida avó. Olhei para o céu,
te vi brilhando, como a mais fulgurante
de todas as estrelas, quem sabe
até valsando com o vovô, uma linda valsa
chamada Royal Cinema.

PS - “liformes” = uniformes. Chamado assim, antigamente,
pelas pessoas nascidas no interior do RN

(*) PRAIEIRA – Serenata do Pescador, mais conhecida como Praieira, de autoria de Othoniel Menezes (poema) e melodia de Eduardo Medeiros (violinista). Por Decreto Legislativo, em 22/12/1971, foi considerada Canção Tradicional de Natal (RN).
Fonte: CD Nação Potiguar, que entitula o projeto de mesmo nome, da Fundação Hélo Galvão e parceria do Spritorin Candinha Bezerra – Natal (RN)

quarta-feira, 25 de julho de 2012

DESINFORMÁTICA

Por Mércia Dantas


Aprendi todas as aulas:
como te amar, como me amar, como amar os outros.

Aprendi a criar caixas, não de diálogos,
mas a dialogar com meu coração.

Aprendi a pegar na alça do texto para editorar,
mas preferi lembrar  minha alça ao seu alcance.

Aprendi a dar cor, usando o pagemaker,
ou até o clipart.
Mas preferi colorir as partes que te adoram.

Desinformatizei minha mente
e desaprendi todas as técnicas que ensinastes,
para apenas sentir como te amo.

Formatei meu coração
e inseri todos os aromas, para exalar minha paixão.

Aprendi tudo que não devia.

E agora, que faço
Se não posso exibir,
nem editar quanto te quero.

E agora professor, o que eu faço?
Se tento gravar no disquete minha paixão
e o sistema apenas diz:

Busy! Try again.

Brasília - maio/1993

terça-feira, 24 de julho de 2012

LIVRE NOVAMENTE


Sou livre.
Livre novamente,
como na música “Free Again”,
minha preferência.

Para sonhar, amar, escrever,
viajar no tempo
e pelo tempo que quiser.

Sou menino passarinho,
como na canção de Luiz Vieira,
minha maior emoção.

Sinto vontade de voar,
feito asa delta, como em meus sonhos,
sobre a imensidão do mar.

Ao encontro da paz,
da alegria eterna,
e de um grande amor,
novamente...

20/05/2003 – Brasília (DF)

VIÚVA NEGRA


Por Mércia Dantas

Enquanto ruma a violência lépida – deixando para a humanidade destino quase assustador, senão trágico -, quedo-me a lembrar de um instante que ficou: quando nasceram os lírios, quando o branco era a pureza, a paz.

Hoje, veio meu país vermelho, flamejante, em guerra... de todos os tipos. Todos estão em guerra, até  contra si mesmos. Há uma iminente condição de estado de alerta. Cuidado, pode ser agora... por favor, ainda não exploda. Ainda não faça a guerra.

Ainda há tempo para a paz.

Irmãos matam irmãos e entregam pela entrega do que não pode ser. Do que não pode ser. Será verdade? Nem sei mais, já me confundo e profundo meu sono se fará nesta noite como nas demais, pelo cansaço, pela espera.

Há um absurdo rufar de tambores e matraquear das metralhadoras agora não mais em mãos de soldados, mas de todo e qualquer um que as tenha.

Já não se vê mais o verde. Cadê a esperança? Onde estão os velhos castelos, não os da velha Inglaterra, mas dos sonhos de todos nós? Quem me dirá da espera da moiçola pura a suspirar por seu príncipe montado num garanhão branco? E onde estão os garanhões de minha mocidade? Fugiram todos, ou estão a desfilar o que ainda resta de suas hombridades?

Ah, é tudo tão diferente. Fuja, cruze o oceano, flane mais alto, alcance as gaivotas. Elas lhe ensinarão, certamente, o que é liberdade. Aqui embaixo é tudo tão impossível, tão distante.

A viúva negra não é mais viúva, é liberta.

E, como boa tecedeira, enreda cada dia mais rápido a teia na qual estamos nos envolvendo. E vamos, cada vez mais, ficando próximos do que não pensamos: nosso fim.

Abril/1995 – Brasília (DF)

ASSIM, TÃO DE REPENTE...


E eu nem mais pensava
Que a fogueira ardia

E nem mais lembrava
Do gosto bom da paixão em brasas

E nem mais sabia
Que você viria...

Assim, tão de repente!

(1995 – Maio, em Muriú-RN)