terça-feira, 24 de julho de 2012

VIÚVA NEGRA


Por Mércia Dantas

Enquanto ruma a violência lépida – deixando para a humanidade destino quase assustador, senão trágico -, quedo-me a lembrar de um instante que ficou: quando nasceram os lírios, quando o branco era a pureza, a paz.

Hoje, veio meu país vermelho, flamejante, em guerra... de todos os tipos. Todos estão em guerra, até  contra si mesmos. Há uma iminente condição de estado de alerta. Cuidado, pode ser agora... por favor, ainda não exploda. Ainda não faça a guerra.

Ainda há tempo para a paz.

Irmãos matam irmãos e entregam pela entrega do que não pode ser. Do que não pode ser. Será verdade? Nem sei mais, já me confundo e profundo meu sono se fará nesta noite como nas demais, pelo cansaço, pela espera.

Há um absurdo rufar de tambores e matraquear das metralhadoras agora não mais em mãos de soldados, mas de todo e qualquer um que as tenha.

Já não se vê mais o verde. Cadê a esperança? Onde estão os velhos castelos, não os da velha Inglaterra, mas dos sonhos de todos nós? Quem me dirá da espera da moiçola pura a suspirar por seu príncipe montado num garanhão branco? E onde estão os garanhões de minha mocidade? Fugiram todos, ou estão a desfilar o que ainda resta de suas hombridades?

Ah, é tudo tão diferente. Fuja, cruze o oceano, flane mais alto, alcance as gaivotas. Elas lhe ensinarão, certamente, o que é liberdade. Aqui embaixo é tudo tão impossível, tão distante.

A viúva negra não é mais viúva, é liberta.

E, como boa tecedeira, enreda cada dia mais rápido a teia na qual estamos nos envolvendo. E vamos, cada vez mais, ficando próximos do que não pensamos: nosso fim.

Abril/1995 – Brasília (DF)

Nenhum comentário:

Postar um comentário